Arquitectura y cine. Las Horas

En 2008 en Lisboa escribí este comentario sobre la representación de la Arquitectura en el Cine, en base a la película Las Horas inspirada en el libro de Virginia Woolf, «La señora Dalloway». Entonces no había leído ni pensado mucho sobre arquitectura y diseño para el trabajo doméstico ni sobre epistemología feminista. Ahí comencé a encontrar libros del tema, a leer una y otra vez «Una habitación propia»,… digamos que fue el principio de la investigación que ahora realizo y que es una de las inspiraciones del trabajo de aRRs a! El comentario os puede gustar más o menos, pero la película hay que verla! Está en portugués, pero creo que se entiende.

Comentário critico sobre As Horas/The Hours (Stephen Daldry  EUA 2002 Cor – 115 min.)

Trata-se um dos conteúdos do curso: O espaço do silêncio (a domesticidade como suporte da ideia de representação do eu) mas neste caso centrando-se na figura da mulher. Desta forma se amplia ou se modifica o ponto de vista do filme que se viu na aula para este tema “A palavra” de Dreyer. Pois como naquele filme o espaço domestico serve como marco para as pessoas perguntar-se sobre a sua humanidade, mas neste caso se suma o tema do género porque as pessoas que estão em questão no filme são mulheres e a sua vertente feminina de “donas de casa” tem parte importante no filme.

A obra cinematográfica como dispositivo mediador da experiência arquitectónica.

Escolhi este filme (baseado no livro “The Hours” de Michael Cunningam, ao mesmo tempo baseado no livro de Virginia Woolf, A senhora Dalloway)  porque parece-me interessante ver como todos os criadores que estão relacionados com esta obra utilizam a arquitectura ou a cidade para expressar sentimentos, criar ambientes ou personagens.

“As horas” esta obcecado com Mrs Dalloway de forma muito apropriada, porque o seu tema é a obsessão ou o fascínio das vidas presentes por memorias e livros, por passados distantes e futuros perdidos, por romances e poemas que se lerão ou escreverão.”[1]Assim também, as casas e as cidades, os espaços que aparecem no filme, tem um ar de sonhos ou recordações que as faz prototípicas, desta maneira se podem comparar e analisar como parte de um imaginário geral. Parece-me interessante porque com muitos poucos dados conhecemos em uma hora e quarenta e cinco minutos as vidas de três mulheres, os cenários estão escolhidos tão intencionalmente que ajudam a isso, para nós, desde a arquitectura é ao contrario, as histórias nos servem para perceber esses entornos físicos.

O enquadramento no espaço domestico e a abertura espiritual

“A vida de uma mulher num só dia”, diz Nichole Kidman como Virgínia Woolf no filme, “só um dia e nesse dia toda a sua vida. Neste dia, de todos precisamente neste, o seu destino se faz evidente…” Vê-se interrompida, então, por uma servente que quer perguntar-lhe sobre a comida. Este é o ponto de partida deste comentário critico: três mulheres, cada uma na sua época, que se movem no espaço domestico, por diversas razões, num dia muito importante para elas.

Como em Dreyer o enquadramento nos espaços domésticos, fechados e reduzidos não se faz para reduzir a história ou desvinculá-la do exterior ou dos outros, a ligação é noutra dimensão. “Quanto mais fino (o fio argumental) –a duração mais distante descende no sistema como uma aranha- mais efectivamente o out-of-field desempenha a sua outra função que é introduzir o transespacial e o espiritual no sistema, que nunca está perfeitamente fechado. Dreyer fiz isto com um método ascético: quanto mais fechada espacialmente estava a imagem, incluso reduzida a duas dimensões, maior a sua capacidade de abrir-se a uma quarta dimensão que é o tempo, e a uma quinta que é o Espírito.”[2]

Este mecanismo acrescenta-se com outro mecanismo argumental, que vem do filme ser “neto” do livro da Virgínia Woolf. E é pôr as protagonistas numa situação domestica especial (uma visita, a organização duma festa e o aniversário do marido). O dia da festa é o dia do acontecimento, os espaços e as pessoas ficam num estado de excitação que “iluminam qualquer coisa que passaria facilmente invisível no dia a dia: sob o brilho de uma festa, sujeitas à sua tensão particular, as pessoas ficam mais vulneráveis.”[3] No filme as festas não são tão espectaculares como no livro, ou não chegam a acontecer, mas as mulheres protagonistas se dedicam a sua preparação, cada uma à maneira da época. Quem tenha feito uma tarefa doméstica pode saber como esse fazer mecânico pode desviar o pensamento e levá-lo do tacto das gemas de ovo nas mãos ou da visão da farinha cair desde a peneira aos pensamentos mais abstractos e espirituais, e ainda mais com a excitação da festa próxima. Assim, no filme, parece que nada esteja a acontecer. “Não há uma narrativa em si, com início, meio e fim. Há o banal, o quotidiano.”[4] Sem perceber-se de tudo isto, o espectador vê e acompanha o arrumar um quarto, falando sobre a felicidade.

Nos três casos o questionar-se a sua existência chega até o extremo de decidir nos três casos sobre a vida ou a morte. E depois de cada um destes pensamentos tão definitivos, se contrapõe uma cena dos trabalhos domésticos: “unta-se a forma com manteiga” diz a Laura depois de a Virginia decidir que a sua protagonista tem que morrer por alguma coisa que não pareça importante. Aliás, isto permite ver como cada uma destas mulheres se move no espaço domestico, a sua relação com ele, com um espaço predisposto para o acontecimento, com os móveis mudados de lugar ou a casa bem limpa ou as serventes muito atarefadas.

A repetição fractal como instrumento do cinema para a criação de personagens

“As suas escolhas diárias, o seu comportamento rotineiro, as suas emoções, seriam espelho para toda a sua vida anterior e posterior, assim como os fractais se repetem e se repetem e se repetem.”[5] A diferença da literatura, o cinema serve-se de imagens para expressar ou apoiar as ideias. Isto se toma como hipótese para ver a crítica ou a imagem da casa e a cidade que se lê no filme, pois cada espaço interior ou modelo de cidade se entende como uma ampliação do estado de ânimo dos protagonistas. Não aparecem quase imagens da cidade no filme, por exemplo, mas é o exemplo fractal mais significativo, pois o espectador sente que a cidade onde os personagens moram será o resultado do sumatório de muitas vidas semelhantes às que está a conhecer.

A negação da cidade ou a sua magnificação

Manuel Delgado disse numa leitura que algumas das passagens dos pensamentos da Senhora Dalloway são talvez a melhor celebração da cidade, com toda a sua complexidade, que alguma vez se escreveu.[6] Ela, no livro, caminha por as ruas de Londres e não encontra nada que possa ser mais excitante, relaciona-se com aquela sociedade e dá festas para ela. É curioso que um filme baseado no livro se desenvolva predominantemente no espaço domestico. Talvez é por a diferença entre os filmes  e a literatura e os seus instrumentos.

As personagens do filme vivem a negação da cidade, só a Clarissa de Nova Iorque recria a vivencia da cidade de Mrs. D., é a única que parece poder sair de casa sem dar explicações, move-se por uma cidade atarefada e participa também dela.

As outras duas mulheres moram no subúrbio. A Virginia Woolf, por causa da sua doença, mora em Richmond em 1923, o seu tratamento precisa de calma e tem de ser afastada da atividade da cidade. É neste tempo quando escreve sobre Londres e, no filme, recria-se esta situação com a cena da estação de comboio. Ali, que se pode sentir um cheiro distante de Londres trazido pelo sonido dos comboios, é que ela revela-se contra a sua reclusão e escolhe “não o asfixiante anestésico dos subúrbios, senão a violenta sacudida da capital” e segue “se devo escolher entre Richmond e a morte, escolho a morte”.

Se Virgínia Woolf estive reclusa nos subúrbios por a sua doença, parece que foi toda a sociedade americana a que se recluiu na tranquilidade do subúrbio depois da guerra. A Laura dos anos 50, não experimenta a cidade nenhum caso, não sai ao exterior senão é sentada no seu carro, e as ruas que percorre são a repetição até o infinito da sua própria morada. Não é estranho no argumento do filme que ela pense também na morte como saída, a fuga desse cenário sem sujeira, nem gente, sem nenhuma complexidade, sem vida. Como tampouco é estranho que seja Los Angeles.

Manter uma sociedade desde o gerir da casa

Se a cidade se apresenta como sumatório destes protótipos, a casa poderia considerar-se como um espaço no qual se desenvolvem e se vêm as relações primárias. A mulher é a escolhida para representá-las. A Laura, por exemplo, está a fazer o seu papel dentro do sonho americano “Ao voltar da guerra,.. eu acho que eles o mereciam… a nós, eu suponho…tudo isto”, diz ela. E é nesse papel que se a vê mover-se por a casa: fazendo um bolo com o filho, conversando com a outra mulher, limpando, jantando com a família…  Dentro da casa média da época, a mulher era alguém a quem os maridos queriam dar “um lar, uma vida muito parecida com esta. Era a minha ideia da felicidade” E ela tinha de cumprir depois a sua parte. Essa felicidade recria-se numa moradia com jardim, uma cozinha grande e bem equipada, junta com a sala de estar e a sala de jantar, à que se acede directamente desde a porta de entrada, à que dão as portas de todos os quartos, desde onde a mulher pode organizar a casa e fazer comodamente o seu trabalho.

A casa vitoriana onde mora Virginia Woolf, estando também no subúrbio, é muito diferente. Há serventes, por exemplo, que são os que fazem o trabalho manual e tem como base a cozinha, com a sua própria escada, diferente da que vá dos quartos superiores privados às salas do piso baixo. Estas salas são grandes e estão comunicadas, mas estão tão abarrotadas de móveis e coisas, tão decoradas cada uma nela mesma que se percebem como espaços diferentes, a mulher e o homem, fazem o papel de gestores, dão as ordens e moram na casa como estaríamos agora num hotel que fos nosso próprio. Parece que parte do tratamento da Virginia seja participar destas actividades, e ela não o faz com muitas ganas, para manter a normalidade.

As casas do ano 2001 em Nova Iorque são bem diferentes, sobretudo porque nas outras duas estava bem claro que era a normalidade ou o pressuposto. No dia da Clarissa Vaughn se nos mostram uma grande variedade de opções familiares, a sua casa é um corredor largo com as estâncias aos lados, estes espaços podem albergar muitas actividades diferentes: um quarto de dormir, um estudo ou biblioteca, um quarto para a filha sem pai,.. A cozinha é também muito grande, mas toda a gente sabe se desenvolver nela, não é o domínio duma única pessoa ou dos serventes. Pareceria que a mulher já foi liberada do seu peso, que uma casa assim exemplifica a capacidade de decisão dos indivíduos, mas há uma outra casa que ela leva adiante, a do seu amigo Richard, que dá-nos uma outra visão do espaço domestico, É uma assoalhada muito desarrumada, a qual Clarissa revisa e cheia de flores, e onde é questionada a sua existência, como se fazer esse trabalho, se manter o ordem fos uma coisa trivial. Aqui vê-se uma outra carga que as pessoas levam consigo no tempo actual, a procura da relevância nas suas vidas.

O espaço físico da individualidade

O funcionamento da casa, e como extensão sua o da sociedade, percebe-se no filme, mas também o efeito que tudo isto tem sobre o individuo. Quando Clarissa volta à sua casa, se a vê como num quadro de Vermeer, pensando nas suas coisas junto à janela. Laura Brown, entretanto, não tem um espaço próprio, nunca está sozinha no filme, só no quarto do hotel. Segundo as reflexões dum autor, não tem individualidade. Pois a necessidade de um quarto próprio “demostraba la conciencia cada vez mayor de individualidad, de una vida personal interior mayor y la necesidad de expresar esa individualidad de forma física.”[7]

É do século XVIII em Inglaterra que fala o autor, quando as pessoas começaram ter consciência da sua individualidade e a precisar de um espaço próprio. A Virginia do princípio do século XX lutava por ele, mas não por um espaço próprio onde fazer um papel na obra de teatro social, senão por um espaço próprio para a criação.

As mulheres dos 50 da classe média americana tinham um espaço reservado para elas, de feito a casa em geral estava muito pensada para elas como “donas de casa” como já se viu, mas servia-lhes para fazer o seu trabalho nessa casa “standard”. Não tinham um espaço próprio para pensar sobre a relevância da sua vida como a Clarissa do 2001 que dispõe de toda a sua casa. A Laura está sempre a ser observada, os seus movimentos e acções, assim os planos se tomam desde a altura do seu maior observador, o filho. O espectador tem nestas cenas uma sensação de inquietude devido a isto.

Conclusão

O filme pode ter muitas formas de percebê-lo e interpretá-lo, mais acho que quem o veja vai encontrá-lo muito belo, e isso não é só por a qualidade estética das imagens, mas também por a beleza dos sentimentos que transmite. Para mim foi muito interessante ver como a arquitectura participa na criação destes sentimentos com a maquiagem, a caracterização, os vestidos,.. E também tentar perceber como desde outras disciplinas a arquitectura é avaliada.  No final, acho que a disciplina da arquitectura não é tão critica com ela mesma com os ambientes que constrói para as pessoas, muitas vezes não temos esta delicadeza para estudá-los.

Ainda o final do filme, quando são os sobreviventes os que ficam, fazendo mais uma vez as coisas rotineiras, arrumando o cenário da festa que não foi. E mais uma vez no espaço da sua casa e com a ressaca dos acontecimentos, apreciando mais a vida graças ao sacrifício do poeta. Ele tentou como a Virginia Woolf, não aceitar a sua reclusão da doença que não lhes permitia viver, senão que tentar “mirar a vida à cara, sempre… e conhecê-la, por o que é… assim poderás conhecê-la, querê-la por o que é, e depois, guardá-la dentro.” Fico, pois, com esta atitude insistente e incansável para o estudo dos ambientes humanos.

ARQUITECTURAS FILMADAS. FAUTL. Maio 2008.       Prof. Centeno Jorge


[1] Michael Wood num artículo sobre o livro “The Hours” no New York Times.

[2] Cinema1. The movement image. Gilles Deleuze., p. 17

[3] Stella McNichol. Introdução ao livro A festa de Mrs Dalloway, Virginia Wolf.

[4] As mulheres de Virginia Wolf, João Barreto. (www.dropsdeanis.org)

[5] As mulheres de Virginia Wolf, João Barreto. (www.dropsdeanis.org)

[6] Manuel delgado é professor no Departamento de Antropologia Social da Universtitat de Barcelona.

[7] La casa: historia de una idea. Witold Rybczynski. p. 118

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